Friday, April 29, 2011

Pérolas do Nyemayer



Mais uma prova de que a caduquice só ocorre para os que se negam a
continuar vivendo normalmente. Vejam o que ele deixa em seu blog no
twitter, pois há algumas perfeitas para começar a semana.
PÉROLAS DE OSCAR NIEMAYER (102 ANOS)

- Ganhei um convite para ver o filme da Bruna Surfistinha. Espero que
seja MESMO um filme sobre surf. O filme da Bruna Surfistinha é uma
apologia ao baixo meretrício e aos mais baixos instintos humanos. Mas
pelo menos rolou uns peitinhos.



- Meu médico me proibiu de tomar vinho todos os dias. Sorte que ele
não falou nada sobre Smirnoff Ice.

- Fui convidado para ver o pessoal do Comédia em Pé. Só não vou
porque minha artrite não deixa ficar em pé muito tempo.

- Esse humor do Zorra Total já era antigo quando eu era criança.

- Linda, eu não vou a museus. Eu CRIO museus. Quer ir Ver uns
museus?

- Sem sono e a fim de sair pro agito. Quem embarca?

- Existem apenas dois segredos para manter a lucidez na minha idade:
o primeiro é manter a memória em dia. O segundo eu não me lembro.

- Ivete Sangalo me encomendou o primeiro trio elétrico de concreto
armado do mundo. O pessoal aqui no escritório já apelidou de
"Sangalão". A proposta era fazer o "Sangalão" de madeira para ficar
mais leve. Aí eu disse pra Ivete "Quer de madeira? chama um
MARCENEIRO!".

- Projetar Brasília para os políticos que vocês colocaram lá foi
como criar um lindo vaso de flores pra vocês usarem como PINICO.

- Caro Sarney: ser imortal na Academia Brasileira de Letras é mole.
Quero ver é tentar ser aqui fora!

- Nunca penso na morte, NUNCA. Vou deixar para pensar nisso quando
tiver mais idade.

- Perto de mim Justin Bieber ainda é um espermatozóide.

- Odeio praias lotadas aos domingos. Não dá pra surfar direito, é
o maior crowd.

- Brasília nunca deveria ter sido projetada em forma de avião. O de
camburão seria mais adequado. Na verdade quem projetou Brasília foi
Lúcio Costa. Eu fiz uns prédios e avisei que aquela merda não ia
dar certo. Sim, ela é aquele avião que não decola NUNCA. Segundo a
Nasa, Brasília é inconfundível vista do espaço.

- Duro admitir, mas atualmente Marcela Temer é o monumento mais
comentado de Brasília.

- Todos ficam falando Zé Alencar é isso, Zé Alencar é aquilo. Mas
quem fez Pilates e caminhou na praia hoje? EU!

- O frevo foi criado há 104 anos. Ou seja: só tive um ano de
sossego desse pessoal pulando de guarda-chuvinha.

- Segredo da Longevidade 48: Não viva cada dia como se fosse o
último. Viva como se fosse o primeiro.

- Na minha idade, a melhor coisa de acordar de madrugada para ir ao
banheiro é ter acordado.

- Alguns homens melhoram depois dos 40. E eu mesmo só comecei a me
sentir mais gato depois dos 90.

- Queria muito encontrar um emprego vitalício. Só pra garantir o
futuro, sabe... Andei Comprando apostilas para Concurso do Banco do
Brasil. Não quero viver de arquitetura o resto da vida.

- Foi-se o John Herbert, 81 anos. Essa molecada da área artística
se acaba rápido demais.

- Só me arrependo de UMA coisa na vida: de não ter cuidado melhor
da minha saúde para poder viver mais.

- São Paulo mostrou ao Brasil como se urbanizar com inteligência:
basta fazer o exato contrário do que aconteceu lá.

- Fato: o meu edificio Copan aparece em 50% dos cartões postais de
São Paulo. DE NADA.

- A quem interessar possa: eu NÃO estive presente na fundação de
São Paulo há 457 anos. Na verdade eu não fui nem convidado.

- Se eu projetasse a casa do Big Brother os participantes iriam
brigar pra ver quem saía PRIMEIRO.

- A vida é um BBB e eu quero ser o último a sair

Thursday, April 28, 2011

Massacre ‘AMOK’



Massacre ‘AMOK’

Posted: 23/04/2011
por RAYMUNDO DE LIMA*
Os primeiros massacres em escolas pareciam sintomas do mal-estar da cultura anglo-saxônica: Estados Unidos, Escócia, Alemanha. Mas depois ocorreu em Israel (com terroristas palestinos), na Rússia (com terroristas tchetchenos, com 386 mortos, maior número de vítimas fatais), no sul da Argentina e até na China. Como os chineses não têm fácil acesso às armas de fogo, facões foram usados contra crianças.
Os massacres vêm ocorrendo em número maior nas escolas pelo mundo; deveriam ser obra de psicopatas ou psicóticos, agindo a esmo, sem motivo e sem sentido. Faz uma década que alguém levantou uma ‘boa’ hipótese sobre este tipo de crime: reação racional às humilhações e intimidações (bullying). Mas, sinalizo: é apenas uma hipótese. Como aprendemos em Metodologia da Pesquisa, hipótese é uma afirmação provisória, para ser investigada sistematicamente com os critérios da ciência. Ela pode ou não ser comprovada.
Um dos poucos sociólogos a estudar sobre o assunto, o alemão Robert Kurz, denominou tal ato criminoso de “amok”: vem de Amok, palavra de origem malaia, que significa raiva cega; é empregada pela psiquiatria para designar o ser humano tomado por fúria cega que sai matando pessoas e animais, aparentemente sem motivo e, na maioria dos casos, suicidam-se no final.
Em verdade, o amok não apresenta sintomas de psicose (loucura), nem antecedente criminal, mas sua personalidade parece ser resultado de ressentimentos acumulados, raciocínio vingativo generalizado e disposição para treinamento com armas de fogo visando eliminar maior número de pessoas. Pode ser reação ao bullying, mas porque os 99,9 que sofreram bullying não saem por aí matando pessoas e animais?
Também dizer que o criminoso é psicopata indica desconhecer o que é psicopatia, sociopatia e o perfil amok. O massacre amok é um ato louco, sim, mas seus assassinos não são psicopatas/sociopatas, nem necessariamente psicóticos como parece indicar a conduta do responsável pelo ataque à escola do Realengo. O bilhete suicida escrito por ele levanta a hipótese de transtorno de personalidade com fanatismo religioso, próximo do estilo dos terroristas fundamentalistas que lutam por causas delirantes ou políticas. Para fanáticos que lutam por uma causa política ou mística vale tudo, principalmente quando é possível adquirir armas e aprimorar o acerto nos alvos escolhidos.
Os estudiosos sobre o assunto hoje trabalham com um perfil do criminoso amok: 61% ocorre por vingança (bullying), 61% são depressivos reativos, 83% sofrem dificuldade para lidar com perdas, 93% demonstram comportamento estranho, 95% dos ataques são planejados com armas de fogo adquiridos de parentes ou conhecidos.
Qualquer lugar onde há facilidade de conseguir armas, eleva a probabilidade de ocorrência de atos deste tipo. Os crimes amoks indicam que:
a) Todos os assassinos eram homens;
b) Personalidade esquizo, calados, ressentidos, fora do controle da família;
c) Viciados em jogos e filmes violentos;
d) Sabiam manejar as armas como se fossem profissionais;
e) Antes, não apresentam qualquer sinal de comportamento desviante ou histórico de delinquência, mas tinham histórico familiar complicado;
f) Escolheram uma escola, universidade ou shopping, ou seja, os massacres são planejados para serem públicos: “não se trata de alvejar os passantes a partir de uma janela escondida: a matança é teatral” (Calligaris: FSP, 19/03/09).
ALERTA: o massacre da escola de Realengo pode ter aberto a caixa de Pandora, isto é, pode acontecer novamente em escolas e universidades do território brasileiro. Portanto, não é exagero se secretarias de educação elaborassem manuais e até treinos de sobrevivência para professores, alunos e funcionários, como já acontece em algumas partes do planeta. A esquerda brasileira, nestas horas, deve levar em conta que o treino militar “preventivo” é obrigatório nas escolas e universidades da China, Cuba, Coréia do Norte.
Também os gestores das escolas públicas ou particulares deveriam providenciar apoio psicológico individual ou em grupo para professores, alunos e funcionários, que se identificaram profundamente com o sofrimento e desespero dos colegas da escola Tasso da Silveira. Para as personalidades que perderam a ternura na luta política ou que visam apenas lucros de empresa, esta proposta parece exagerada ou absurda.
Instalar catracas, câmeras, detector de metais, mas sem um estudo minucioso, poderá ser dinheiro desperdiçado. Mas, cada escola deve fazer seu próprio estudo e discutir sobre “que fazer”. É mais prudente, sim, investir na formação ‘realista’ dos professores e reformar a cultura da escola, para além dos modismos e ideologismos. Será difícil refundar a cultura da escola se continuarmos com o nosso modo de viver sem-vínculos, sem-amizade, sem-confiança no outro, e acreditar numa segurança produzida pelos condomínios fechados ou edifícios com câmeras, guardas e cerca elétrica.
Por outro lado, que fazer, senão buscar uma prevenção limitada ou relativa, usando meios eletrônicos, guardas, cachorros, etc. Se os professores e alunos se sentissem responsáveis pelo bem público, não teriam deixado ladrões roubarem tantos aparelhos caros da universidade. Ou teriam impedido estupros e sequestros relâmpagos. Enquanto não amadurecemos nosso senso de vigilância e responsabilidade para com a coisa pública, cabe aos gestores da universidade irem em busca de contratar empresas e plano especial de segurança. Nesta esteira de medidas paliativas (neoliberais?) é que voltamos à discussão sobre o desarmamento, no Brasil. Depois do massacre na Alemanha, em 2009, o governo aprovou leis duras de desarmamento da população. Até agora, não houve mais massacres amoks e outros crimes bárbaros neste país. Mas nos EUA, que são reféns da indústria bélica, nada é feito neste sentido. E os crimes amoks vêm ocorrendo em intervalos cada vez menores.
Como prevenção, é imperiosa uma nova educação ou “educomunicação”, para formar sujeitos capazes de discernir a realidade concreta da realidade violenta produzida pelas mídias. Porque os assassinos amoks atuam como se estivessem vivendo a realidade de um filme ou jogo eletrônico, só que com armas de verdade. A mídia contribui como reforço da cultura da violência, sim, mais pela repetição e espetacularização. Dá sempre impressão que bom é ser mau. Que o bandido é sempre o herói, ainda que tenha matado muitas crianças inocentes.
Ainda, só uma “nova” educação poderia “trabalhar” os sintomas de fanatismo (religioso, político, desportivo, midiático) e perda do senso de fronteira entre o real e o virtual produzido pelas mídias. Também os pesquisadores precisam calibrar suas pesquisas, incluindo mais este tema e problema.
"OBSERVAÇÃO de 18/04/2011: parei de ler os comentários de especialistas e tagarelistas sobre o massacre de Realengo, porque estava me dando náuseas. Se por um lado é necessário fazer crítica ao sensacionalismo da imprensa televisiva, por outro, não deve escapar de também serem criticadas as pseudo-análises, porque ambas se sustentam em critérios puramente ideológicos e parecem extrair gozo da situação trágica pra fazer sua propaganda política. Isto é nojento. Embrulha o meu estômago. Lamentavelmente, existe muita “opinião” (piruadas) e pouca ou nenhuma “episteme” nos escritos que li na internet e nos debates que assistir na TV aberta e por assinatura. Mais profundo foi a entrevista com o professor da Faculdade de Educação da USP, Julio Groppa Aquino, que cumpriu sua função docente de instigar o debate, superarmos o senso comum pedagógico, o senso comum psicológico e o senso comum sociológico. Há um texto do Antonio Zuin que também aprofunda o crime amok, publicado anos antes. Apenas o professor Aquino pediu “sobriedade e certo distanciamento, à moda dos antigos”, visando decantar as informações e superar a “tagarelice explicativa” do pessoal da imprensa e dos políticos profissionais e amadores que nos rondam. “Se quisermos honrar os mortos de fato, precisaremos mais do que alguns minutos de silêncio. Precisaremos nos aquietar (…). Aos que crêem no sobrenatural, cabe rezar pelos que se foram. Aos demais, resta-nos apenas um nó na garganta, um nó que não desata” (ver entrevista disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos.escola-de-seguranca-maxima,704293,0.htm).
Além de faltar fazer “dialética com a realidade concreta”, suspeito que muitas pseudo-análises se acovardam diante da realidade dos fatos, apresentando sempre um cobertor curto teórico para uma realidade complexa. Poucos, enfim, são prudentes na análise lógica dos fatos e fenômenos, e ao mesmo tempo falta humildade necessária para reconhecer que neste tipo de violência estamos como cegos diante de um elefante (lembrando o filme de mesmo nome, e a lição budista, lembrados por Aquino). Observei que os mais irresponsáveis intelectualmente misturam massacre ‘amok’ com serial killer, psicopatia, psicose, sociopatia, fanatismo, fundamentalismo, terrorismo, etc. Por falar em terrorismo, depois do 11 de setembro/2001, soube alguns professores irresponsáveis ou criminosos em potencial, fizeram elogios ao ato criminoso que matou civis de tantos países. Seriam eles influência nefasta dos jovens desequilibrados que, na internet, elogiam o massacre de Realengo?"


* RAYMUNDO DE LIMA é Professor do DFE-UEM e Doutor em Educação pela USP. (Publicado originalmente em O DIÁRIO do Norte do Paraná, em 15/04/2011. Aqui, com alterações e complementos).
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Tuesday, April 26, 2011

Preço da gasolina


A Petrobras está divulgando uma nota que não podia ser mais esclarecedora:
” R$ 1,05. É esse o preço do litro da gasolina, sem adição de etanol, vendida pela Petrobras desde 2009. Em 9 de junho daquele ano, houve reduçãode 4,5%. Desde então, não ocorreu mais nenhuma alteração no preço da gasolina vendida às distribuidoras na porta das refinarias.”
Isso representa 28% do preço pelo qual vem sendo vendido o combustível. A empresa diz que o resto são 40% impostos (dos estados) e  e 11%margens de lucro dos distribuidores e postos (privados) e 22% o preço do álcool misturado à gasolina à razão de 25%.
Portanto, em 10 litros de combustível vendido – a R$ 3 o litro, no posto -  há 7,5 litros de gasolina, que custam R$ 7,88.  E 2,5 litros de álcool, que custam R$ 6,06.
O litro da gasolina ( estatal) custa R$ 1,05 e o do álcool (privado) R$ 2,42.
Custava, há pouco mais de uma semana. Porque já está em R$ 2,72, segundo a cotação do mercado, hoje.
Reduzir a quantidade de álcool anidro (não é o mesmo que o hidratado, vendido nos postos) vai obrigar a Petrobras a importar, pois a nossa capacidade de refino de gasolina está esgotada e os investimentos da Petrobras em ampliar o número de refinarias – R$ 40 bilhões – são de maturação demorada.
Ou o Governo entra de sola sobre o setor alcooleiro ou leva a culpa que não tem pelo aumento dos combustíveis.
Enquanto isso as multis vão avançando sobre a indústria sucroalcooleira, dominando o processamento da cana.
Fonte: Tijolaço

Tragédia em Realengo se transforma em circo de horrores dissociado de reflexão social



Tragédia em Realengo se transforma em circo de horrores dissociado de reflexão social

Posted: 21/04/2011
por DUARTE PEREIRA*
“Alô, alô, Realengo:
Aquele abraço!”
(Gilberto Gil, no samba-exaltação Aquele abraço, ao partir para o exílio, forçado pela ditadura militar)

A dor pelas mortes e pelos ferimentos, brutais e gratuitos, das crianças e pré-adolescentes da Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro do Realengo, na cidade do Rio de Janeiro, não deve obscurecer nossa consciência crítica.
Nada que é humano é somente individual. É individual e social. Mesmo a loucura e suas consequências.
Em que exemplos de violência e insensibilidade, reais e fictícios, o rapaz Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos, ex-aluno da escola atingida, buscou inspiração? Onde conseguiu informações sobre o manejo de armas e o planejamento de massacres? Como adquiriu os dois revólveres e a farta munição que utilizou? Por que Wellington, filho de uma paciente psiquiátrica, arredio desde criança, e que já apresentava há vários meses, após o falecimento dos pais adotivos, sinais perceptíveis de descontrole e decadência pessoal, foi esquecido sozinho numa casa herdada, sem apoio nem assistência?
A forma capitalista de vida social, sobretudo em seus traços contemporâneos, engendra um individualismo cada vez mais exacerbado e uma perda crescente de atenção e solidariedade das pessoas entre si. Não é possível outra forma de sociabilidade humana, que reduza tragédias como a que ensanguentou ontem pela manhã o bairro carioca de Realengo?
Estou cada vez mais estarrecido com a cobertura predominantemente passional e facciosa da tragédia ocorrida em escola municipal do Rio de Janeiro, no bairro do Realengo.
O jovem Wellington de Oliveira, autor dos disparos que mataram e feriram alunos inocentes da escola, foi chamado de “meliante” nas primeiras declarações do policial que o abateu e continua sendo indigitado como “assassino” por quase toda a mídia, embora já se saiba que sofria de esquizofrenia desde criança. A mídia negligencia as informações de que Wellington, quando era aluno da escola, passou por vexames e humilhações por causa de sua introversão e bizarrices. Não aborda a falta de acompanhamento e tratamento adequados de um paciente diagnosticado de esquizofrenia desde criança, o que agravou a evolução de sua enfermidade. Não trata das informações sobre atentados e manejo de armas que podem ser acessadas facilmente na internet. Não reavalia a divulgação maciça, cotidiana e acrítica dos mais variados atos e formas de violência praticadas por grandes potências e contumazes delinquentes, reproduzidos em filmes de sucesso e até mesmo em jogos eletrônicos. Não esclarece como Wellington conseguiu as armas e as munições, sem as quais não poderia ter feito seus disparos cruéis e desvairados. Não alerta para a atmosfera envenenada de individualismo e competição em que a infância e a juventude vêm sendo forjadas.
Com essa cobertura irresponsável e superficial, a maioria da mídia apenas acirra a dor e as reações equivocadas dos parentes das vítimas e de um amplo setor popular. E, nesse clima irracional, as autoridades policiais já alertam para possíveis ataques de represália a familiares do jovem atirador.
São poucos também os professores e mais reduzidas ainda as entidades do magistério que têm vindo a público para lembrar a violência que se tornou endêmica nas escolas, principalmente nas escolas públicas, rebatendo a ideia de que a tragédia do Realengo possa ser considerada um fato isolado e imprevisível. Surpreende também que os movimentos de saúde, sobretudo os de saúde mental, não se empenhem em repor a apreciação do trágico acontecimento num quadro mais objetivo e multilateral, que leve em conta a condição do autor dos disparos, a falta de acompanhamento e tratamento de seu padecimento mental e as circunstâncias finais de abandono e solidão que precederam seu gesto de sofrida insanidade. Preocupa também que juristas de indiscutíveis convicções democráticas não se pronunciem para reclamar o tratamento jurídico adequado que merece um jovem esquizofrênico, mesmo que pratique atos de grande crueldade.
Abalados pelo acontecimento, que não conseguem entender satisfatoriamente, muitos parecem retroceder à Idade Média, quase pregando a condenação dos loucos como endemoninhados e bruxos e seu justiçamento nas chamas de fogueiras.
Vêm à lembrança as advertências de Engels e de Rosa Luxemburgo de que o declínio da civilização capitalista poderia ser seguido não por um salto socialista, mas por uma regressão à barbárie. É preciso insistir, portanto, na necessidade de lutar pela alternativa de uma civilização superior, socialista, baseada não apenas no poder democrático dos trabalhadores, na propriedade social dos meios de produção, no  planejamento das atividades econômicas ou em serviços públicos universais e de qualidade, principalmente nas áreas de saúde, educação e previdência, mas também em valores de respeito, solidariedade e ajuda mútua no convívio social.
Questões que não querem calar
O programa “Fantástico” transmitido pela Rede Globo na noite de domingo exibiu novas reportagens sobre a tragédia que se abateu sobre a Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro do Realengo, na cidade do Rio de Janeiro. As reportagens devem ter suscitado novas preocupações nos espectadores atentos.
1) É legal e admissível que a polícia carioca repasse imagens e documentos da investigação para a Rede Globo com exclusividade, discriminando os outros veículos de comunicação?
2) Segundo as imagens transmitidas, as professoras das duas salas de aula invadidas pelo atirador foram as primeiras a fugir, deixando para trás as crianças e adolescentes pelos quais eram responsáveis. Por que a entrevistadora não questionou esse comportamento? Por que as autoridades educacionais do Rio de Janeiro não apuram, nem discutem com as famílias dos alunos, a conduta da direção, dos professores e dos funcionários da escola no episódio, até mesmo para estabelecer padrões de reação escolar na eventual repetição de ocorrências semelhantes? Segundo regra conhecida, o comandante de uma embarcação que naufraga deve ser o último a abandoná-la.
3) Relatos de colegas de Wellington de Oliveira, reproduzidos pelo programa da Globo, confirmaram que o menino introspectivo e vulnerável costumava ser objeto de gozações e humilhações na escola. Grupos de alunas o cercavam, roçando seu corpo e simulando assediá-lo sexualmente, para o sádico divertimento de outros alunos e alunas que assistiam. Em uma ocasião pelo menos, colegas mais fortes o levantaram pelas pernas, enfiaram sua cabeça numa privada e acionaram a descarga, conforme os entrevistados admitiram. Contraditoriamente, uma das professoras que abandonou precipitadamente a sala de aula, deixando para trás seus alunos, declarou enfaticamente no programa da Globo que nunca houve “histórico de violência” na Escola Municipal Tasso da Silveira. O que era feito com Wellington não configura violência e violência repetida? Como são supervisionados os banheiros, os horários de recreio e as saídas das escolas, que se têm revelado momentos e espaços críticos para a integridade e a segurança de alunas e alunos mais indefesos?
4) Conforme as declarações de um dos irmãos de criação de Wellington, a mãe deles foi chamada à escola, alertada para o comportamento discrepante do aluno e aconselhada a procurar um psicólogo ou psiquiatra para avaliá-lo. Isso foi feito? Em nossa sociedade capitalista, sobretudo na fase neoliberal e privatizante que atravessa há cerca de duas décadas, existe serviço público na região capaz de assegurar esse atendimento, tratamento e acompanhamento? Por que esses aspectos da tragédia não são pesquisados, nem discutidos?
5) Por que não têm sido ouvidos juristas competentes sobre os aspectos penais envolvidos em atos de jovens esquizofrênicos, mesmo que esses atos sejam chocantes, brutais e injustificáveis como os que abalaram a escola do Realengo? Se Wellington tivesse sobrevivido, ele poderia ser levado a júri e condenado à prisão? É correto tratá-lo raivosamente como “criminoso” e “assassino” como qualquer jovem normal e imputável, esquecendo seu prolongado e negligenciado sofrimento mental? A dor merecida pelas vítimas de sua insanidade e a solidariedade com os familiares dos alunos mortos e feridos devem impedir a solidariedade com os familiares do autor dos disparos e a compaixão pelo jovem que premeditou e executou o massacre e acabou sendo vítima de seus próprios atos tresloucados?
A tragédia do Realengo precisa ser debatida de forma séria e multilateral se a intenção for evitar a repetição de ocorrências semelhantes e não apenas disputar índices de audiência.
É preciso insistir: tudo que é humano é inseparavelmente individual e social. Inclusive a loucura e suas consequências. O capitalismo contemporâneo incentiva, mais do que nunca, o individualismo, a competição, a insensibilidade. Exalta os vencedores e despreza os derrotados. Pode queixar-se de colher os frutos de seu darwinismo social?
Internem a Globo?
O locutor William Bonner anunciou ontem à noite (11/04) em tom dramático pelo Jornal Nacional, transmitido pela Rede Globo para todo o país, que o “homem” que assassinou “covardemente” alunas e alunos da escola carioca Tasso da Silveira mantinha contatos com um grupo “terrorista” supostamente islâmico, insinuando que esse grupo o poderia ter influenciado a planejar e executar o ataque sangrento à escola.
Era o que faltava. A Globo encontrou a linha ideal de investigação policial para tentar impedir qualquer discussão séria e abrangente sobre as causas que levaram à tragédia do Realengo e para deslocar as responsabilidades por essa tragédia da direita para a esquerda do espectro político. Nada de falar na esquizofrenia do jovem Wellington de Oliveira, nem na falta de apoio e tratamento que agravou sua enfermidade. Nada de recordar as perseguições e humilhações que sofreu quando era aluno da escola atacada. Nada de mencionar as informações sobre armas e massacres que podem ser acessadas facilmente na internet. Nada de aludir à cultura de individualismo, competição e insensibilidade disseminada pelo capitalismo contemporâneo. Nada de referir-se aos filmes, jogos e exemplos de truculência e crueldade que vêm dos Estados Unidos e das outras potências imperialistas. A grande questão passou a ser, para a Globo, os contatos de Wellington com um alegado grupo “terrorista”, que pode nem ser real, mas criado pela imaginação doentia do jovem.
Acresce que para os monopólios capitalistas de informação como a Globo a palavra “terrorismo” abarca tanto os atos de terror propriamente ditos e as organizações que os praticam quanto à resistência armada de povos oprimidos, como o palestino. Em contrapartida, para esses monopólios da informação, Estados, exércitos e partidos como os de Israel e dos Estados Unidos, que bombardeiam e devastam outros países e assassinam seletivamente seus líderes, não praticam o terrorismo. Assim, ao tentar envolver um suposto grupo “terrorista” nos atos tresloucados do jovem Wellington, a Globo busca comprometer setores que a população costuma considerar de esquerda no massacre justificadamente repudiado.
No esforço para montar essa versão tendenciosa, a Globo não se constrangeu sequer com uma objeção de simples bom senso: por que algum grupo terrorista, de direita ou de esquerda, teria interesse em insuflar um ataque à modesta escola municipal de bairro periférico do Rio de Janeiro?
Para revestir de alguma credibilidade a insinuação, o Jornal Nacional ouviu o ministro da Justiça que se prestou a declarar que a Polícia Federal apoiará todas as linhas de investigação da Polícia Civil do Rio de Janeiro, inclusive a do alegado envolvimento de grupo “terrorista” com as maquinações do jovem Wellington de Oliveira. O que não consegue a poderosa Globo?


* DUARTE PEREIRA é jornalista, escritor e ex-dirigente da Ação Popular. Publicado noCORREIO DA CIDADANIA, 13/04/2011, disponível em http://www.correiocidadania.com.br/content/view/5716/9/

Monday, April 25, 2011

AVISO AOS FUNCIONÁRIOS


DA DIRETORIA AOS FUNCIONÁRIOS 
INDUMENTÁRIA : 
Informamos que o funcionário deverá trabalhar vestido de acordo com o seu salário.
Se o percebermos calçando um tênis Nike de R$ 350,00 e carregando uma bolsa Gucci de R$ 600,00, presumiremos que vai bem de finanças e, portanto, não precisa de aumento.
Se ele se vestir de forma pobre, será um sinal de que precisa aprender a controlar melhor o seu dinheiro, para que possa comprar roupas melhores e portanto, não precisa de aumento.
E se ele se vestir no meio termo, estará perfeito e, portanto, não precisa de aumento. 


AUSÊNCIA DEVIDO À ENFERMIDADE:
Não vamos mais aceitar atestado médico como prova de enfermidade.  Se o funcionário tem condições de ir até o consultório médico, pode vir trabalhar. 

CIRURGIA:
As cirurgias são proibidas.
Enquanto o funcionário trabalhar nesta empresa, precisará de todos os seus órgãos, portanto, não deve pensar em remover nada. Nós o contratamos inteiro. Remover algo constitui quebra de contrato.


AUSÊNCIAS DEVIDO A MOTIVOS PESSOAIS:
Cada funcionário receberá 104 dias para tratar de assuntos pessoais a cada ano.  Chamam-se sábado e domingo. 

FÉRIAS: 
Todos os funcionários deverão entrar em férias nos mesmos dias de cada ano. Os dias de férias são: 01 de janeiro, 07 de setembro e 25 de dezembro. 

AUSÊNCIA DEVIDO AO FALECIMENTO DE ENTE QUERIDO: 
Esta não é uma justificativa para perder um dia de trabalho.Não há nada que se possa fazer pelos amigos, parentes ou colegas de trabalho falecidos.
Todo esforço deverá ser empenhado para que não-funcionários cuidem dos detalhes.
Nos casos raros, onde o envolvimento do funcionário é necessário, o enterro será marcado para o final da tarde.
Teremos prazer em permitir que o funcionário trabalhe durante o horário do almoço e, daí, sair uma hora mais cedo, desde que o seu trabalho esteja em dia.
 
AUSÊNCIA DEVIDO À SUA PRÓPRIA MORTE:
Isto será aceito como desculpa. Entretanto, exigimos pelo menos 15 dias de aviso prévio, visto que cabe ao funcionário treinar o seu substituto
O USO DO WC:  (extremamente  necessário) 
Os funcionários estão passando tempo demais no toalete.
No futuro, seguiremos o sistema de ordem alfabética.
Por exemplo, todos os funcionários cujos nomes começam com a letra 'A' irão entre 8:00 e 8:20, aqueles com a letra 'B' entre 8:20 e 8:40, etc. Se não puder ir na hora designada, será preciso esperar a sua vez, no dia seguinte. 

Em caso de emergência, os funcionários poderão trocar o seu horário com um colega.
Os supervisores dos funcionários deverão aprovar essa troca, por escrito, mas há um limite estritamente máximo de 3 minutos no vaso. Acabando esses 3 minutos, um alarme irá tocar, 
o rolo de papel higiênico será recolhido, a porta do box abrirá e uma foto será tirada.
Se for repetente, a foto será fixada no quadro de avisos da empresa sob o título 'Infrator Crônico'. 

A HORA DO ALMOÇO: 
Os magros têm 30 minutos para o almoço, porque precisam comer mais para parecerem saudáveis.
As pessoas de tamanho normal têm 15 minutos para comer uma refeição balanceada que sustente o seu corpo mediano.
Os gordos têm 5 minutos, porque é tudo que precisam para tomar um 'Slim Fast' e um remédio de regime.
Muito obrigado pela sua fidelidade à nossa empresa.

Portanto, toda dúvida, comentário, preocupação, reclamação, frustração, irritação, agravo, insinuação, alegação, acusação, observação, consternação e 'input' deverá ser dirigida para o RH., com a carteira de trabalho em mãos, para acerto das diferenças.


Atenciosamente:
Diretoria de Recursos Humanos

Wednesday, April 20, 2011

Monja Coen, o nome do dia.


JAPÃO

    Quando voltei ao Brasil, depois de residir doze anos no Japão, me incumbi da difícil missão de transmitir o que mais me impressionou do povo Japonês: kokoro.    

    Kokoro  ou Shin significa coração-mente-essência.

    Como educar pessoas a ter sensibilidade suficiente para sair de si mesmas, de suas necessidades pessoais e se colocar à serviço e disposição do grupo, das outras pessoas, da natureza ilimitada?
    Outra palavra é gaman: aguentar, suportar.  Educação para ser capaz  de suportar dificuldades e superá-las.

  Assim, os eventos de 11 de março, no Nordeste japonês, surpreenderam o mundo  de duas maneiras. A primeira pela violência do tsunami e dos vários terremotos, bem como dos perigos de radiação das usinas nucleares de Fukushima.  A segunda pela disciplina, ordem, dignidade, paciência, honra e respeito de todas as vítimas.
    Filas de pessoas passando baldes cheios e vazios, de uma piscina para os banheiros. Nos abrigos, a surpresa das repórteres norte americanas: ninguém queria tirar vantagem sobre ninguém.  Compartilhavam cobertas, alimentos, dores, saudades, preocupações, massagens. Cada qual se mantinha em sua área.  As crianças não faziam algazarra, não corriam e gritavam, mas se mantinham no espaço que a família havia reservado. Não furaram as  filas para assistência médica, quantas pessoas necessitando de remédios perdidos mas esperaram sua vez também para receber água, usar o telefone, receber atenção médica,  alimentos, roupas e escalda pés singelos, com pouquíssima água.
    Compartilharam também do resfriado, da falta de água para higiene pessoal e coletiva, da fome, da tristeza, da dor, das perdas de verduras, leite, da morte. Nos supermercados lotados e esvaziados de alimentos, não houve saques.  Houve a resignação da tragédia e o agradecimento pelo pouco que recebiam.  Ensinamento de Buda, hoje enraizado na cultura e chamado de kansha no kokoro: coração de gratidão.
    Sumimasen é outra palavra chave.  Desculpe, sinto muito, com licença. Por vezes me parecia que as pessoas pediam desculpas por viver.  Desculpe causar preocupação, desculpe incomodar, desculpe precisar falar com você, ou tocar à sua porta.  Desculpe pela minha dor, pelo minhas lágrimas, pela minha passagem, pela preocupação que estamos causando ao mundo.  Sumimasem.
    Quando temos humildade e respeito pensamos nos outros, nos seus sentimentos, necessidades. Quando cuidamos da vida como um todo, somos cuidadas e respeitadas.
    O inverso não é verdadeiro: se pensar primeiro em mim e só cuidar de mim, perderei.  Cada um de nós, cada uma de nós é o todo manifesto.
    Acompanhando as transmissões na TV e na Internet pude pressentir a atenção e cuidado com quem estaria assistindo: mostrar a realidade, sem ofender, sem estarrecer, sem causar pânico.  As vítimas encontradas, vivas ou mortas eram gentilmente cobertas pelos grupos de  resgate e delicadamente transportadas – quer para as tendas do exército, que serviam de hospital, quer para as ambulâncias, helicópteros, barcos, que os levariam a hospitais.
    Análise da situação por especialistas, informações incessantes a toda população pelos oficiais do governo e a noção bem estabelecida de que “somos um só povo e um só país”. Telefonei várias vezes aos templos por onde passei e recebi telefonemas.  Diziam-me do exagero das notícias internacionais, da confiança nas soluções que seriam encontradas e todos me pediram que não cancelasse nossa viagem em Julho próximo.
    Aprendemos com essa tragédia  o que Buda ensinou há dois mil e quinhentos anos: a vida é transitória,  nada é seguro neste mundo,  tudo pode ser destruído em um instante e reconstruído novamente.
    Reafirmando a Lei da Causalidade podemos perceber como tudo  está interligado e que nós humanos não somos e jamais seremos capazes de salvar a Terra.  O planeta tem seu próprio movimento e vida.  Estamos na superfície, na casquinha mais fina.  Os movimentos das placas tectônicas não tem a ver com sentimentos humanos, com divindades, vinganças ou castigos. 
    O que podemos fazer é cuidar da pequena camada produtiva, da água, do solo e do ar que respiramos.  E isso já é uma tarefa e tanto.
    Aprendemos com o povo japonês que a solidariedade leva à ordem, que a paciência leva à tranquilidade e que o sofrimento compartilhado leva à reconstrução. Esse exemplo de solidariedade, de bravura, dignidade, de humildade, de respeito aos vivos e aos mortos ficará impresso em todos que acompanharam os eventos que se seguiram a 11 de março.
    Minhas preces, meus respeitos, minha ternura e minha imensa tristeza em testemunhar tanto sofrimento e tanta dor de um povo que aprendi a amar e respeitar.
    Havia pessoas suas conhecidas na tragédia?, me perguntaram. E só posso dizer : todas.  Todas eram e são pessoas de meu conhecimento.  Com elas aprendi a orar, a ter fé, paciência, persistência.  Aprendi a respeitar meus ancestrais e a linhagem de Budas.


Mãos em prece (gassho)

Monja Coen

Sunday, April 17, 2011

Mais cidadãos



Na Folha de S. Paulo do dia 13, quarta-feira:
RUY CASTRO


RIO DE JANEIRO – Que cena! Eu, um cidadão quase em idade de poder furar fila em bancos e tomar ônibus de graça, sendo vasculhado, com as pernas abertas e os braços em cruz, por uma geringonça eletrônica em busca de objetos suspeitos, na entrada da Feira dos Nordestinos, em São Cristóvão, outro dia. Teria feito mais sentido se o segurança me examinasse na saída, depois da fabulosa buchada de cabrito -esta, sim, um torpedo- que devorei num restaurante da feira.
Quem diria que o ataque a Nova York, em 2001, levaria a que, dez anos depois, uma singela feira popular brasileira se equipasse para detectar pistolas e peixeiras entre seus frequentadores? Mas foi o que aconteceu. Do detector de metais no aeroporto à humilhante porta giratória dos bancos e ao bastão que escaneia os torcedores na rampa dos estádios e ginásios, a paranoia não parou de crescer.
Dali estendeu-se aos shows de rock, à recepção em empresas públicas e privadas (com direito a retratinho compulsório no balcão) e, depois do massacre de Realengo, ameaça ser adotada até pelas escolas de 1º grau. Quando isso acontecer, cada brasileiro, não importa a idade, será visto como um suspeito, um potencial assassino em massa, alguém a não se tirar os olhos de cima durante qualquer evento.
Você dirá que, se essa medida já tivesse sido implantada, o matador Wellington não teria entrado tão facilmente na escola em Realengo. Talvez não. Mas quem o impediria de postar-se num terraço ou janela próximos e fuzilar as crianças quando elas saíssem à rua? E se, um dia, for possível vigiar todo mundo, quem vigiará os vigias?
O fato de o Brasil estar infestado de detectores de metal prova que as armas já são um problema. Eliminá-las não impedirá que, um dia, surja um novo Wellington. Mas nos tornará mais seguros, mais confiantes e mais cidadãos.

Friday, April 15, 2011

A EXECUTIVA, O CÉU, E O INFERNO


    A EXECUTIVA, O CÉU, E O INFERNO Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou. Deu um gemido e apagou. Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso Portal. Ainda meio zonza, atravessou-o e viu uma miríade de pessoas.Todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava acontecendo, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes: - Enfermeiro, eu preciso voltar urgente para o meu escritório, porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque meu convênio médico é classe A, e isto aqui está me parecendo mais um pronto-socorro. Onde é que nós estamos? - No céu. - No céu?... - É. - Tipo assim... o céu, CÉU...! Aquele com querubins voando e coisas do gênero? - Certamente. Aqui todos vivemos em estado de gozo permanente. Apesar das óbvias evidências nenhuma poluição, todo mundo sorrindo, ninguém usando telefone celular), a executiva bem-sucedida custou um pouco a admitir que havia mesmo apitado na curva. Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável. Porque, ponderou, dali a uma semana ela iria receber o bônus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa. E foi aí que o interlocutor sugeriu: - Talvez seja melhor você conversar com Pedro, o síndico. - É? E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária? - Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece. - Assim? (...) - Pois não? A executiva bem-sucedida quase desaba da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro. Mas, a executiva havia feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu rapidinho: - Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e... - Executiva... Que palavra estranha. De que século você veio? - Do 21. O distinto vai me dizer que não conhece o termo 'executiva'? - Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo. Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização. - Sabe, meu caro Pedro. Se você me permite, eu gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para esse povo todo aí, só batendo papo e andando a toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistêmica. - É mesmo? - Pode acreditar, porque tenho PHD em reengenharia. Por exemplo, não vejo ninguém usando crachá. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê? - Ah, não sabemos. - Entendeu o meu ponto? Sem controle, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo isto aqui vai acabar virando uma anarquia. Mas nós dois podemos consertar tudo isso rapidinho implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance. - Que interessante... - É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização e um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver. - !!!...???...!!!...???...!!! - Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Acionista... Ele existe, certo? - Sobre todas as coisas. - Ótimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias high-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, me parece extremamente atrativo. - Incrível! - É óbvio que, para conseguir tudo isso, nós dois teremos que nomear um board de altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias de praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho certeza de que você vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar em um Turnaround radical. - Impressionante! - Isso significa que podemos partir para a implementação? - Não. Significa que você terá um futuro brilhante... se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque você acaba de descrever, exatamente, como funciona o Inferno... Max Gehringer (Revista Exame)

Thursday, April 14, 2011

O humor da lógica



1. Deus é amor. O Steve Wonder é cego. O amor é cego. Logo, o Steve
Wonder é Deus.

2. Nada é melhor que a felicidade eterna. Um tomate já é melhor que
nada.
Logo, um tomate é melhor que a felicidade eterna.

3. Imagine um pedaço de queijo suíço, daqueles cheios de buracos.
Quanto mais queijo, mais buracos. Cada buraco ocupa o lugar em que haveria queijo.
Assim, quanto mais buraco, menos queijo. Quanto mais queijo, mais buraco e quanto mais buraco, menos queijo. Logo, quanto mais queijo, menos queijo.

4. Toda a regra tem uma exceção. Isto é uma regra. Logo, deveria
ter uma exceção. Portanto, nem toda a regra tem uma exceção.

5. Disseram-me uma vez que eu sou ninguém. Ninguém é perfeito.
Logo, eu sou perfeito. Mas só Deus e perfeito. Portanto, eu sou Deus.
Mas se o Steve Wonder é Deus, eu sou o Steve Wonder! Porra, eu sou cego!

Tuesday, April 12, 2011

LUA DE MEL EM LISBOA



Manoel casou-se com uma linda mulher e, furioso, volta para a casa da
mãe no dia seguinte.

- Manoel! - disse-lhe a mãe, surpresa, o que aconteceu?
 
- Ora pois, mãe... Depois da festa de casamento, eu levei Maria para o
hotel e fui para a cama com ela. Bom... nós íamos fazer amor, quando
eu descobri que ela era virgem!

- Ora pois, uma virgem, quem diria, como é que pode?

- Então eu decidi ir embora e nunca mais olhar na cara daquela mulher!

- Fizestes muito bem filho, o que não serviu para os outros, também
não serve para ti!

Tuesday, April 05, 2011

O Valioso Tempo dos Maduros





Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha. Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. 'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa... Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade. Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena, e para mim, basta o essencial! Mário de Andrade (1893-1945)

Monday, April 04, 2011

Vitória que não alivia



Foi, com certeza, a pior semana do ano para o Atleticano. No meio da  semana a derrota, sem qualquer explicação, para o horroroso Grêmio Prudente. O pior, um time morto em campo e sem reação. O Torcedor, impaciente claro, queria e ainda quer um Galo, Forte, Vingador, que aprendemos a conhecer ao longo dos mais de cem anos de nossa história de glórias. Eu, particularmente, que tive o privilégio de comemorar o título de 1971 e acompanhar os times dos anos 70 e 80, não consigo me conformar com o que estou vendo nos últimos tempos.
Muda jogador, treinador, diretoria e tudo fica na mesma. Entre os últimos presidentes, três entre quatro não concluíram seu mandato. Paulo Curi, Nélio Brant e Ziza Valadares são suportaram a pressão, resultados e – principalmente – ao movimento interno de conspiração contra seus mandatos. Só Ricardo Guimarães cumpriu o mandato até o final, ainda assim levando o clube à vexatória passagem pela Segunda-Divisão. Chegou até a anunciar que deixaria o cargo, mas esperou recolocar o Galo no seu lugar antes de concluir seu mandato.
Durante todo esse período, ou seja, quase duas décadas, os resultados pífios e uma oposição que conspirava contra os presidentes, o Galo foi perdendo sua condição de clube forte no cenário esportivo mundial. Essa conspiração não existe agora e disso a diretoria não pode reclamar. Não sei onde aqueles que tanto “sacanearam” o Galo, numa atitude de autofagia, estão atualmente. Seja onde for, pelo menos não estão atrapalhando à distância como fizeram no passado. Aqueles “pitacos” sumiram.
Voltando ao momento atual: o que comemoramos na atual gestão? O tútulo minero de 2010, entregue pelas mãos do teimoso Adilson Batista, que escalou um time misto na partida semifinal, colocando o Ipatinga naquela decisão. “Mamão com açúcar”, plagiando o legendário Dadá.
Depois da vergonha em Presidente Prudente, que desmascarou o time que imaginávamos ser digno da tradição Atleticana, as confusões tiveram continuidade. No sábado, véspera de jogo pelo campeonato mineiro, foram dispensados sem justificativa que convença Ricardinho e Zé Luis. A diretoria promete contar tudo no início da semana. Que explique mesmo, pois ambos jogam muito mais que vários que insistentemente estão sendo mantidos no time.
Até que isso aconteça, estamos no campo das especulações. Numa delas dá conta de que na reunião de sábado, promovida para “sacudir” o time, Ricardinho teria reagido ao esculacho que vinha tomando conta do encontro, no que foi seguido pelo Zé Luis. A outra versão que circula é que os dois jogadores teriam procurado o treinador para reclamar da escalação de alguns jogadores, destacadamente o Ricardo “Dueno” ou “Doendo”, como queiram, no time, fato que teria irritado o comandante e culminou nessa nova crise interna. Depois do Neymar é o Bueno? Sem comentário!
Seja uma, outra, ou qualquer que seja, a verdade é que o torcedor está ficando de “saco cheio”. Falo em meu nome pessoal, mas seguro que grande parte da massa pensa assim. A paciência está no limite. Dorival tem o crédito de ter salvado o time ano passado, mas agora é o responsável pelo que estamos assistindo.
Eu, Eduardo de Ávila, orgulhosamente Atleticano, vou e sempre fui a todos os jogos. Seja domingo, sábado, quarta, quinta e até na terça como já aconteceu, sempre estou lá. Jogos como mandante, claro, e isso já acontece fazem anos. Mesmo com Belo Horizonte sem estádios, numa “borrada” coletiva de diretores e autoridades, estou presente nos jogos do Galo. Exceção nos poucos realizados em Ipatinga. Já em Sete Lagoas, estive em todos. As duas últimas partidas que não pude assistir, foram a vitória sobre a Ponte Preta – em agosto de 2005 – e empate em dois gols com o time da Enseada das Garças, em fevereiro de 2006.
Reação Imediata Galo!
PS 1) Apesar do crédito que ainda tem, o Renan Ribeiro voltou a falhar no gol do Democrata. Salvo melhor juízo, este foi o terceiro gol que tomamos por ele soltar a bola nos pés do atacante adversário. O famoso “rebote” fatal.
PS 2) Para não perder a oportunidade. Ganhamos, mas o juiz e bandeirinha, como sempre errando contar o Galo. Num único lance o banderinha marcou impedimento inexistente e ainda aconteceu uma penalidade não marcada pelo árbitro. Dois erros terríveis. Vale dizer que o juiz foi o mesmo que em 26 de fevereiro anulou um gol legitimo do América de Teófilo Otoni, tirando uma vitória sobre o time da Enseada e validou um deste mesmo clube, em posição duvidosa, na partida com o América. Essa vem sendo a tônica das arbitragens no Brasil e, especialmente, em Minas Gerais.
 
 
Canto do Galo - Eduardo de Ávila, Jornalista e Advogado.Tesoureiro-Geral da AMCE - Associação Mineira dos Cronistas Esportivos; Secretário do CEPPO - Centro de Cronistas Políticos e Parlamentares de Minas Gerais; Presidente da ADFAMIC - Associação dos Diplomados pela Faculdade de Direito Milton Campos. Fale com ele: eduardodeavila@oi.com.br

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Saturday, April 02, 2011

J’ACUSE !!!



J’ACUSE !!!
(Eu acuso !)

(Tributo ao professor Kássio Vinícius Castro Gomes)
  « Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice.(Émile Zola)
Meu dever é falar, não quero ser cúmplice. (...) (Émile Zola)
Foi uma tragédia fartamente anunciada. Em milhares de casos, desrespeito. Em outros tantos, escárnio. Em Belo Horizonte, um estudante processa a escola e o professor que lhe deu notas baixas, alegando que teve danos morais ao ter que virar noites estudando para a prova subsequente. (Notem bem: o alegado “dano moral” do estudante foi ter que... estudar!).
A coisa não fica apenas por aí. Pelo Brasil afora, ameaças constantes. Ainda neste ano, uma professora brutalmente espancada por um aluno. O ápice desta escalada macabra não poderia ser outro.
O professor Kássio Vinícius Castro Gomes pagou com sua vida, com seu futuro, com o futuro de sua esposa e filhas, com as lágrimas eternas de sua mãe, pela irresponsabilidade que há muito vem tomando conta dos ambientes escolares.

Há uma lógica perversa por trás dessa asquerosa escalada. A promoção do desrespeito aos valores, ao bom senso, às regras de bem viver e à autoridade foi elevada a método de ensino e imperativo de  convivência supostamente democrática.

No início, foi o maio de 68, em Paris: gritava-se nas ruas que “era proibido proibir”. Depois, a geração do “não bate, que traumatiza”. A coisa continuou: “Não reprove, que atrapalha”. Não dê provas difíceis, pois “temos que respeitar o perfil dos nossos alunos”. Aliás, “prova não prova nada”. Deixe o aluno “construir seu conhecimento.” Não vamos avaliar o aluno. Pensando bem, “é o aluno que vai avaliar o professor”. Afinal de contas, ele está pagando...

E como a estupidez humana não tem limite, a avacalhação geral epidêmica, travestida de “novo paradigma” (Irc!), prosseguiu a todo vapor, em vários setores: “o bandido é vítima da sociedade”, “temos que mudar ‘tudo isso que está aí’; “mais importante que ter conhecimento é ser ‘crítico’.”

Claro que a intelectualidade rasa de pedagogos de panfleto e burocratas carreiristas ganhou um imenso impulso com a mercantilização desabrida do ensino: agora, o discurso anti-disciplina é anabolizado pela lógica doentia e desonesta da paparicação ao aluno – cliente...

Estamos criando gerações em que uma parcela considerável de nossos cidadãos é composta de adultos mimados, despreparados para os problemas, decepções e desafios da vida, incapazes de lidar com conflitos e, pior, dotados de uma delirante certeza de que “o mundo lhes deve algo”.
Um desses jovens, revoltado com suas notas baixas, cravou uma faca com dezoito centímetros de lâmina, bem no coração de um professor. Tirou-lhe tudo o que tinha e tudo o que poderia vir a ter, sentir, amar.

Ao assassino, corretamente , deverão ser concedidos todos os direitos que a lei prevê: o direito ao tratamento humano, o direito à ampla defesa, o direito de não ser condenado em pena maior do que a prevista em lei. Tudo isso, e muito mais, fará parte do devido processo legal, que se iniciará com a denúncia, a ser apresentada pelo Ministério Público. A acusação penal ao autor do homicídio covarde virá do promotor de justiça. Mas, com a licença devida ao célebre texto de Emile Zola, EU ACUSO tantos outros que estão por trás do cabo da faca:

EU ACUSO a pedagogia ideologizada, que pretende relativizar tudo e todos, equiparando certo ao errado e vice-versa;

EU ACUSO os pseudo-intelectuais de panfleto, que romantizam a “revolta dos oprimidos”e justificam a violência por parte daqueles que se sentem vítimas;

EU ACUSO os burocratas da educação e suas cartilhas do politicamente correto, que impedem a escola de constar faltas graves no histórico escolar, mesmo de alunos criminosos, deixando-os livres para tumultuar e cometer crimes em outras escolas;

EU ACUSO a hipocrisia de exigir professores com mestrado e doutorado, muitos dos quais, no dia a dia, serão pressionados a dar provas bem tranqüilas, provas de mentirinha, para “adequar a avaliação ao perfil dos alunos”;

EU ACUSO os últimos tantos Ministros da Educação, que em nome de estatísticas hipócritas e interesses privados, permitiram a proliferação de cursos superiores completamente sem condições, freqüentados por alunos igualmente sem condições de ali estar;

EU ACUSO a mercantilização cretina do ensino, a venda de diplomas e títulos sem o mínimo de interesse e de responsabilidade com o conteúdo e formação dos alunos, bem como de suas futuras missões na sociedade;

EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual, finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã;

EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com segundo grau completo cresceu “tantos por cento”;

EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno “terá direito” de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia;

EU ACUSO os que agora falam em promover um “novo paradigma”, uma “ nova cultura de paz”, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da “vergonha na cara”, do respeito às normas, à autoridade e  do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento;

EU ACUSO os  “cabeça – boa” que acham e ensinam que disciplina é “careta”, que respeito às normas é coisa de velho decrépito;

EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis;

EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não têm coragem de aplicar a devida punição;

EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam “promoters” de seus cursos;

EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores;

Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos -clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia.

Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de “o outro”.

A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: “Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo.”

Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor “nova cultura de paz” que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.

  Igor Pantuzza Wildmann
  Advogado – Doutor em Direito. Professor universitário.